A câmera abre em um quadro com a imagem de Santo Antonio que está localizada atrás da mesa de trabalho de Augusto. Nesse mesmo quadro reparamos no letreiro: “Santo Antonio Casamenteiro das Causas Perdidas”. Nesse mesmo movimento a câmera vai abrindo lentamente e já podemos perceber Augusto e Rosane. Ele em torna de uns trinta e cinco anos e ela em torno de uns sessenta. Ele em sua mesa e ela à frente sendo atendida pelo mesmo. Em toda ação é evidente como eles conversam com extrema seriedade.
ROSANE – Filha minha não casa com filho de jogador.
AUGUSTO – Engraçado... Eu achei que esse fosse o pretendente que você mais ia gostar.
ROSANE – É... Mas eu tive uns problemas com jogo na minha família e peguei um certo trauma, sabe?
AUGUSTO – Perfeitamente, mas o fato do pai ser jogador e ter perdido tudo em uma mesa de pôquer em Mar Del Plata, não quer dizer que o filho é jogador e vai perder tudo em uma mesa de pôquer...
ROSANE – É, mas cada vez que eu olhar pra cara dele eu vou me lembrar do meu pai perdendo tudo em uma mesa de pôquer... Carro, casa, filha... Enfim, Não existe outro pretendente?
AUGUSTO – Existir? Existe, mas o plano que você vai pagar não lhe dá muita opção de escolha... E você tem que pensar que todo mundo tem um defeito... Só que a nossa corporação se propõe a mostrar esse defeito antes do casamento!
ROSANE – Claro que sei... Mas será que você não encontra aí no seu arquivo alguém que não tenha possibilidade de ser preso?
AUGUSTO – Olha aí eu acho difícil porque se bobear até a senhora tem motivo pra ser presa, com todo respeito! Eu só não acredito que os homens que procuram a nossa agência sejam tão bom elementos assim. Mas eu posso ver pra senhora, os melhores pretendentes dentre os candidatos do seu plano de pagamento.
ROSANE – Faça isso, por favor!
Augusto abre uma gaveta e tira uma pasta branca bem grande. Ele começa a procurar e tira rapidamente uma ficha de inscrição (já preenchida).
AUGUSTO – Esse aqui é interessante! Pseudônimo: “Rominha”.
ROSANE – Me fala um pouco mais sobre ele!
Augusto vai lendo a ficha.
AUGUSTO – Claro! 1,85 de altura, alvo, forte, olhar sedutor... A propósito, foi ele que preencheu a ficha... Eu só leio.
ROSANE – Naturalmente!
AUGUSTO – Retomando, Situação financeira estável, (vai falando lentamente, como se estivesse mastigando as palavras) e duas passagens pela polícia.
ROSANE – Pelo o que?
AUGUSTO – Apropriação ilegal de imóveis e lavagem de dinheiro.
ROSANE – Ah! Não é tão pesado assim... E hoje em dia ele faz o que?
AUGUSTO – Ele falsifica vodka. Que por um lado é bom porque de sede a sua filha nunca vai morrer, mas por outro lado é ruim, porque ela pode morrer de cirrose.
ROSANE – É verdade... Você não tem alguma coisa que de mais dinheiro ou até seja mais tranqüilo? Como CPI, Mensalão...
AUGUSTO – Olha, eu até tenho, mas vai além do plano que você pode pagar.
ROSANE – Quanto mais eu tenho que pagar por um plano mais caro?
AUGUSTO – O próximo plano é o Simple Married Plus. Você está no plano Simple Married. O que daria uma diferença de... (Augusto pega a calculadora e faz as contas) cento e setenta e cinco reais. Pouca coisa...
ROSANE – É mais pra quem já pagou mais duzentos e noventa reais pelo Simple Married sai um pouquinho caro, não é? Mas vamos lá... Abre essa pasta!
AUGUSTO – Você sabe que pra eu abrir uma pasta, somente mediante pagamento.
Rosane da um suspiro e retira da carteira cento e setenta e cinco reais, entrega a Augusto. Ele confere e coloca o dinheiro dentro da gaveta. Abre a gaveta de baixo e tira uma pasta um pouco menor que a primeira de cor amarela. Já abre essa pasta e retira um punhado de fichas de inscrição. Enquanto isso, Rosane vai falando.
ROSANE – Seria tão mais fácil que ela tivesse encontrado por si só... Mas imagina, trinta e seis anos e nunca teve um homem! Homem está realmente difícil...
AUGUSTO – Pois é... Se tivesse fácil eu estaria desempregado! Vamos lá... Eu tenho um ótimo aqui!
ROSANE – Q uem?
AUGUSTO – Pseudônimo: Angel. (lendo) “Pareço um anjo exuberante que acaba de levantar vôo em direção ao infinito”.Olha, ele é poeta! “Sou extremamente inteligente, tenho cursos no exterior e sou muito bem de vida”. Meu pai é bicheiro...
ROSANE (interrompendo) – Eu já falei que filha minha não casa com filho de jogador!
AUGUSTO – Eu acho sinceramente, que a senhora está sendo muito radical! O pai dele é bicheiro, ele não perde dinheiro, a não ser é claro que a polícia o pegue, mas fora isso, são as pessoas que dão dinheiro pro pai dele, de certa forma.
ROSANE – É, vai ver o meu pai deu dinheiro pra ele...
AUGUSTO – É vai ver deu mesmo... Mas vamos ao último por hoje, que o tempo da senhora já está esgotando e eu tenho outra cliente aguardando!
ROSANE – Vamos ao último então, espero ter sorte!
Augusto pega a última ficha.
AUGUSTO – Vulgo: “O Homem da Luz”. Alto, forte, bonito. Olhos claros, cabelos curtos e negros. Possui um bom jeito com as mulheres e uma excelente situação financeira! Dono de uma clínica...
ROSANE – Jura?
AUGUSTO – De aborto... Dono de uma clínica de aborto... É dona Rosane... Parece que o dia hoje não esta muito bonito!
ROSANE – Pois é... É só isso que você têm?
AUGUSTO – Por hoje sim, dona Rosane. O tempo da senhora já acabou e eu tenho outra cliente me esperando...
ROSANE – Tudo bem... Eu vou pensar direitinho e depois falo com o senhor... Pode ser assim?
AUGUSTO – Com certeza!
Rosane sai. Corta para:
CENA 2. INTERIOR/ SALA DE ESPERA DA AGÊNCIA/ INTERIOR.
Assim que Rosane sai, ela da de cara com Dora, que já esta em pé pronta para passar da porta.
DORA – Mãe?!
ROSANE – Filha?! Que você está fazendo aqui?
DORA – Que você ta fazendo aqui? Eu posso vir aqui, eu sou solteira! Você, que até onde eu sei, que não deveria estar aqui! Você é casada! Muito bem casada!
ROSANE – Eu não vim aqui por mim não! Vim aqui por você!
DORA – Por mim? Por que por mim? Eu não preciso da sua ajuda não, mãe!
ROSANE – Da minha não! De um casamenteiro! Isso sim que você precisa! Onde já se viu? Quase quarenta anos e não conseguiu arranjar um marido!
DORA – Ai mãe! É verdade! Quem eu estou enganando? Eu preciso de ajuda! Senão eu não vou conseguir um marido nunca! E você encontrou alguém?
ROSANE – Ninguém filha... Só pretendente mau-caráter!
DORA – Qual plano você está pagando?
ROSANE – Eu comecei no “Simple Maried”, mas agora eu passei pro “Simple Maried Plus”.
DORA – Mãe? Tudo que eu estou valendo pra você é um plano “Simple Maried Plus”? Que miséria!
ROSANE – Ah filha! Eu não ando com tanto dinheiro assim na carteira! Aliás, eu não sabia que o “Simple Maried Plus” era tão ruim assim...
Nesse momento, Augusto sai da sala.
AUGUSTO – A senhora está aqui, ainda?
ROSANE – Eu encontrei a minha filha!
AUGUSTO – Não diga! Dora é a sua filha?
DORA – Sim...
AUGUSTO – Bom, podemos então?
ROSANE – Eu infelizmente não vou poder ficar... Eu tenho hora! Mas depois você me conta tudo, ouviu Dora?
DORA – Conto sim mãe! Vai com Deus e obrigada pela força!
Nesse momento entra na sala de espera o Rominha. Bastante diferente de sua descrição na ficha. Ele olha para Dora, ela olha para ele e os dois ficam encantados.
ROMINHA – Oi.
DORA – Oi.
ROMINHA – Rômulo. Mas pode me chamar de Rominha.
ROSANE (estarrecida) – Rominha.
DORA – É mãe! Rominha! Prazer, eu sou Dora!
ROSANE (para Augusto) – Ele é um pouco diferente da descrição, não é não?
Augusto tira a pasta embaixo do braço e retira a ficha de Rominha.
AUGUSTO - 1,85 de altura, alvo, forte, olhar sedutor... É, não parece ele mesmo não.
ROMINHA (para Dora) – Você vem sempre aqui?
Dora fica vermelha.
ROSANE – Filha, eu vou indo...
DORA – Vai mãe... Depois eu conto...
Augusto vai cautelosamente até Rosane, que já está saindo.
AUGUSTO – Dona Rosane.
ROSANE – Sim?
AUGUSTO – No caso dos dois ficarem juntos, a senhora vai ter que completar o pagamento!
ROSANE – Por que? Eles se conheceram por acaso!
AUGUSTO – Mas se conheceram dentro da nossa agência. Sem falar, que a senhora sabe o podre dele...
ROSANE – É verdade... Eu pago como?
AUGUSTO – Queira vir pra minha sala e eu passo pra você todas as informações...
ROSANE – Não, mas eu tenho que...
AUGUSTO – É rapidinho, dona Rosane, prometo que não vai demorar!
Rosane vai com Augusto a sua sala, enquanto Dora e Rominha ficam se admirando na sala de espera.
FIM.
por alberto szafran.
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